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INSTITUTO DE PERMACULTURA E
ECOVILAS |
A ENERGIA DO
SÉCULO 21
Christopher Flavin e Seth
Dunn
A política
energética anunciada pelo Governo Bush é uma oportunidade singular para propor
um sistema energético para o século 21, e recomendar as políticas que
ajudarão o país a realizá-la.
Resta saber se uma
administração liderada por dois ex-executivos da indústria do petróleo com
ligações pessoais e políticas com as fontes energéticas do passado produzirá uma
agenda energética consistente com as necessidades e exigências de um novo
século. A dependência crescente em fontes energéticas do século 20 (petróleo) e
do século 19 (carvão) será um despautério e retrocesso tão grande quanto seria
um projeto para produção em massa de carruagens em 1901.
Também espoliará, de forma
desnecessária e dispendiosa, o meio-ambiente numa época em que existem fontes
energéticas bem mais limpas. E já sabemos que os aliados internacionais dos EUA,
comprometidos com a contenção do aquecimento global, opõem-se ferrenhamente à
expansão da dependência em combustíveis fósseis.
Estamos hoje nos primórdios
de uma revolução energética tão profunda e veloz como a que impulsionou a era do
petróleo, um século atrás. Este novo sistema energético – altamente
descentralizado, eficiente e baseado cada vez mais em recursos renováveis e no
hidrogênio – já começa a surgir em outras partes do mundo. Sem uma liderança de
visão, os Estados Unidos correm o risco de ser ultrapassados por seus
competidores econômicos e comprometer sua credibilidade política no cenário
internacional.
Acreditamos que a estratégia prestes a ser anunciada deverá ser avaliada
na extensão em que incorpore os seguintes princípios de um sistema energético
para o século 21:
1) Eficiência energética:
pedra angular
Os investimentos em eficiência energética – a obtenção dos mesmos
serviços de iluminação, cozimento, aquecimento, mobilidade e industrialização
com menor necessidade de energia – são as primeiras medidas que deveremos
adotar, e não as sugestões retrógradas do vice-presidente Cheney. Faz muito mais
sentido econômico e ecológico obter mais de cada quilowatt ou barril do que
cavar por mais carvão e perfurar por mais petróleo. Os avanços na eficiência do
uso energético com melhores eletrodomésticos, prédios, automóveis e processos
industriais já registraram reduções no volume de energia utilizada por cada
unidade do produto econômico.
Entre 1973 e 1999, o consumo
de energia nos EUA por cada unidade do produto interno bruto caiu em 41%.
Todavia, como comprovado pelos laboratórios nacionais do Departamento de
Energia, os Estados Unidos poderiam reduzir sua relação energia/PIB em mais 10%,
através de políticas voltadas à melhoria de eficiência.
A interrupção dos avanços da
eficiência elétrica contribuiu para os problemas energéticos da Califórnia. E a
não-modernização das bem-sucedidas normas Cafe (sigla em inglês de Economia
Corporativa Média de Combustível) levou aos recentes aumentos dos preços da
gasolina.
Será que a Casa Branca, cujo chefe do Estado-Maior dirigiu a Associação
Americana dos Fabricantes de Automóveis (que tão bem conduziu o lobby para
congelar as normas Cafe), recomendará normas e incentivos significativos para o
incremento da eficiência dos automóveis?
2) Gás natural: ponte
para o futuro
O gás natural é o combustível fóssil mais limpo e de maior crescimento.
E, apesar do recente aumento de preço, tornou-se o combustível escolhido para
geração de energia.
Entretanto, o desafio do gás natural não é a sua exploração em áreas
ecologicamente sensíveis, como o governo aparentemente procura fazer, e sim o
desenvolvimento de novos usos, altamente eficientes, para esse combustível.
Incluindo co-geração (uso combinado de calor e energia) e tecnologias da
microenergia.
“Microenergia” é a expressão utilizada para descrever a tendência global
inequívoca da geração de energia para unidades descentralizadas e eficientes,
como células de combustível e microturbinas movidas basicamente a gás
natural.
É
uma transformação tão profunda quanto a mudança do mainframe para o computador
pessoal, gerando igualmente novas e significativas oportunidades de
negócio.
Agrilhoando o sistema energético dos Estados Unidos ao século 20, os
modelos nucleares e fósseis de grande porte limitarão a competitividade global
da indústria energética americana e, ao mesmo tempo, agravarão os problemas
ambientais e de saúde.
3) Energia nuclear e
carvão: nostalgia
O provável projeto do
Governo Bush de revitalizar indústrias que vêm padecendo de uma morte lenta há
duas décadas é de causar perplexidade. O custo da geração nuclear é
aproximadamente o dobro do de outras fontes energéticas existentes no
mercado.
Esse gasto, combinado com a oposição pública, causou a quase paralisação
de novas construções em todo o mundo. Investidores privados recusam-se a
investir em energia nuclear. Maior subsídio governamental à energia nuclear
seria um desperdício gigantesco de recursos públicos.
Os sinais que o governo
realizará altos investimentos em “carvão limpo” indicam outro dispêndio
imprudente do dinheiro dos contribuintes. O carvão é uma fonte de energia do
século 19 e o mais sujo dos combustíveis fósseis, prejudicando a saúde de
milhões de pessoas a cada ano.
É também uma indústria do
ocaso, que elimina postos de trabalho devido à mecanização. Com os níveis de
emprego se reduzindo em 66% desde 1980, os mineiros de carvão representam hoje
menos de 0,1% da força de trabalho dos EUA. Globalmente, o consumo de carvão
está no seu ponto mais baixo desde 1984. A China reduziu seu consumo em 27%
desde 1996.
4) Energia renovável: rápida, barata e limpa
Outro recente disparate bem
conhecido é que, devido à energia renovável representar atualmente cerca de 2%
da energia total dos EUA, desempenhará apenas um papel mínimo no futuro e
portanto não desmerecedora de um apoio substancial. Poder-se-ia ter cometido o
mesmo erro um século atrás com o petróleo, que representava 2% do consumo
energético em 1900, e se tornou o combustível predominante naquele que alguns
historiadores denominam o “século do petróleo.”
O petróleo surgiu
inicialmente em mercados de nicho, crescendo rapidamente desde então. A energia
eólica e solar estão fazendo o mesmo, expandindo-se globalmente a taxas anuais
de dois dígitos, porém principalmente na Europa e Japão – onde o apoio
governamental está criando um mercado vibrante e gerando empregos de alta
tecnologia e exportação (ver abaixo).
Tendências Globais no
Consumo de Energia (1990-2000)
Fonte
/ Taxa Média de Crescimento
Anual*
Eólica...................................25,1%
Solar
fotovoltaica...................20,1%
Gás
Natural.............................1,6%
Petróleo..................................1,2%
Nuclear...................................0,6%
Carvão...................................-1,0%
*Baseada na
capacidade instalada de energia eólica e nuclear, remessas para energia solar e
consumo de gás natural, petróleo e carvão.
Hoje, a energia eólica é a
fonte energética mundial de maior crescimento, registrando 27% anuais, e é mais
barata do que a geração a gás e carvão. O consumo de energia solar também está
crescendo, particularmente no Japão e Alemanha, cujas políticas de energia
renovável são bem mais eficazes do que as dos Estados Unidos.
Ironicamente, a política de
energia renovável mais forte, em nível estadual, é a do Texas. Lá, uma lei
promulgada durante a gestão de Bush, como governador, exige que as
concessionárias forneçam uma determinada quantidade de energia de fontes
renováveis. Será que poderemos esperar uma norma nacional para a energia
renovável do ex-governador, que tanto fala de introduzir suas histórias de
sucesso texanas em Washington?
5) Hidrogênio: petróleo
do futuro
Poderá o elemento mais abundante do universo ficar ausente na política
energética de Bush? As empresas automotivas e de energia estão despejando
centenas de milhões de dólares no desenvolvimento de células de combustível de
hidrogênio para equipamentos eletrônicos portáteis, sistemas estacionários de
energia e veículos a motor. A tecnologia do hidrogênio e de células de
combustível poderá redirecionar o sistema energético global tão profundamente
quanto a descoberta do petróleo e a invenção do motor de combustão interna, mais
de um século atrás.
No início do ano, o presidente propôs um corte de 48% no orçamento de
pesquisa de hidrogênio. Enquanto isso, como nas corridas tecnológicas
anteriores, as montadoras alemãs e japonesas e as empresas de energia estão
liderando a corrida do hidrogênio/célula de combustível, enquanto Detroit e
Houston ficam para trás. Preservar a dependência no petróleo e deixar de
preparar o terreno para um sistema de energia e transporte baseado no
hidrogênio, enfraquecerá gravemente a segurança energética e diversidade
nacional, reduzindo a competitividade das empresas norte-americanas nos ferozes
mercados automotivos e energéticos.
6) Descarbonizar: visão
de longo prazo
Desde 1850, o sistema energético mundial vem se deslocando constantemente
de combustíveis com alto teor de carbono para outros, de menor teor. Por razões
de eficiência e disponibilidade, nos deslocamos da madeira para o carvão, do
carvão para o petróleo e agora, do petróleo para o gás natural. A próxima
mudança – para o hidrogênio – desponta no horizonte e os riscos da mudança
climática exigem que apressemos sua chegada.
Durante os últimos anos,
executivos da indústria do petróleo e automobilística reconheceram publicamente
esta tendência de “descarbonização,” observando que a era o petróleo está
chegando ao fim. Entretanto, nossos líderes políticos são omissos em discutir
com a população norte-americana a necessidade urgente de descarbonizar
sugerindo, ao invés, uma filosofia de “combustíveis fósseis para sempre” que
carece da visão de longo prazo que sua política energética alega
possuir.
Christopher Flavin é presidente do Worldwatch. Seth Dunn é pesquisador
associado da entidade. Ambos são especialistas em energia.
As publicações do
Worldwatch Institute em português estão no site http://www.wwiuma.org/.br em parceria com a
UMA-UniversidadeLivre da Mata Atlântica.
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